“Não é possível que se continue fazendo o trabalho de entrega sem nenhum direito reconhecido”
A afirmação acima é do atual secretário nacional de economia popular e solidária do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Gilberto Carvalho – ex-chefe-de-gabinete da Presidência da República do presidente Lula entre 2003 e 2010.
Por Humberto Azevedo
“Não é possível que se continue fazendo o trabalho de entrega e mesmo o trabalho também de motorismo do aplicativo sem nenhuma regulamentação, sem nenhum direito reconhecido dos trabalhadores”, afirmou o atual secretário nacional de economia popular e solidária do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Gilberto Carvalho, em entrevista exclusiva a reportagem do Grupo RDM.
Ex-chefe-de-gabinete da Presidência da República do presidente Luiz Inácio Lula da Silva entre 2003 e 2010, Gilberto Carvalho fez esta declaração após participar de uma audiência realizada pela Comissão de Desenvolvimento Urbano (CDU) da Câmara dos Deputados que discutiu a realidade dos entregadores de aplicativo no Brasil no final do último mês de abril.
Para o dirigente do MTE, ex-secretário-geral da Presidência da República do primeiro mandato da ex-presidenta Dilma Rousseff, a expectativa – após um amplo debate envolvendo os trabalhadores e as empresas – “a gente possa, de fato, recompor essa mesa e chegar a compor um projeto de lei [para] que as Casas legislativas aprovem um projeto (…) que definitivamente dê para os trabalhadores o reconhecimento que eles são, sim, autônomos, mas autônomos com direitos”.
“Direito a um piso mínimo, com direito de segurança no trabalho, com direito à transparência nos cálculos de algoritmos e também com direito previdenciário. Então, essa é a nossa expectativa e eu saí dessa audiência com esse compromisso que eu assumi junto aos trabalhadores”, completou Carvalho reconhecendo que o governo errou ao não priorizar dentre as propostas a serem aprovadas em 2025 a iniciativa que regulamentará a situação laboral dos profissionais de aplicativo.
COMISSÃO ESPECIAL

No final do último mês, maio, o presidente da Câmara – deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) criou a comissão especial que vai analisar a regulamentação do trabalho em aplicativos. Segundo Motta, o objetivo do colegiado é estabelecer um arcabouço legal que contemple a realidade de motoristas e entregadores.
Esta comissão analisará a proposta encaminhada pelo governo, assim como diversas outras iniciativas apresentadas pelos mais variados parlamentares. O presidente da comissão especial é o deputado Joaquim Passarinho (PL-PA) e o relator é o deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE).
De acordo com um levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) 1,5 milhão de pessoas foram identificadas trabalhando em 2022 por meio de aplicativos e plataformas digitais.
Abaixo, segue a entrevista exclusiva que Gilberto Carvalho concedeu à reportagem do grupo RDM.
RDM: Como anda a proposta do governo para regulamentar as plataformas como Uber e Ifood? O governo desistiu da proposta?

Gilberto Carvalho: O governo vem para essa audiência com a proposta de abrir esse diálogo, de recompor uma mesa de trabalhadores, de patrões, de empresas e do governo, uma mesa tripartite, onde a gente possa fazer acordos em torno da regulamentação desse trabalho. Não é possível que se continue fazendo o trabalho de entrega e mesmo o trabalho também de motorismo do aplicativo sem nenhuma regulamentação, sem nenhum direito reconhecido dos trabalhadores. Então, a nossa expectativa é que a gente possa, de fato, recompor essa mesa e chegar a compor um projeto de lei que as Casas legislativas aprovem um projeto, que depois será sancionado e que definitivamente dê para os trabalhadores o reconhecimento que eles são, sim, autônomos, mas autônomos com direitos. Com direito a um piso mínimo, com direito de segurança no trabalho, com direito à transparência nos cálculos de algoritmos e também com direito previdenciário. Então, essa é a nossa expectativa e eu saí dessa audiência com esse compromisso que eu assumi junto aos trabalhadores.
RDM: Essa mesa de negociação já foi proposta pelo governo, inclusive, com a elaboração de um projeto, que está parado na Câmara e que não agradou uma boa parte dos profissionais. Não dá para aproveitar essa primeira negociação?

Gilberto Carvalho: Num dado momento, as empresas, sobretudo os entregadores, o Ifood, as demais companhias não concordavam com aqueles temas, não aceitavam aquilo que o governo e os trabalhadores estavam colocando para eles, sobretudo a questão de um preço mínimo para as entregas e preferiram se retirar da mesa, foi uma atitude muito ruim que rompeu o diálogo e impediu que a gente levasse à frente o nosso projeto de lei.
RDM: A participação na previdência para esses profissionais de aplicativo vai estar neste novo projeto?
Gilberto Carvalho: A Previdência é essencial. Para nós, não abrimos mão da questão previdenciária, por quê? O governo tem que ser responsável, a Previdência tem que ser financiada. Então, todo trabalhador e, sobretudo, as empresas precisam contribuir para que os trabalhadores, quando vítimas de acidentes, quando aposentados, tenham o seu ganho e tenham a sua assistência. A Previdência é solidária, ela precisa de contribuição. Então, nós fizemos, inclusive, orçamos, fizemos um cálculo, onde as empresas, naturalmente, pagam muito mais do que os trabalhadores, mas cada trabalhador também dá a sua contribuição, como é feito em toda a legislação trabalhista vigente no país.
RDM: O projeto que o governo apresentou no ano passado, está em tramitação, mas está parado, não há movimentação nem nada. O governo não colocou esse ano, esse projeto dentro das prioridades do próprio governo aprovar até o final do ano. Como que seria isso? Porque o ano que vem tem eleição, inclusive, não? Vai dá para aprovar esse primeiro projeto? Como que isso vai ser? Há cenário para aprovar?

Gilberto Carvalho: A tua crítica está correta, o governo devia ter priorizado esse projeto. Nós estamos trabalhando internamente, junto à ministra Gleisi [Hoffmann], junto aos nossos líderes do governo, na Câmara e no Senado, para que esse projeto ganhe prioridade. Você tem toda a razão, se não for aprovado neste ano, o ano que vem não tem chance nenhuma de se aprovar, dada a contaminação eleitoral, vamos dizer assim. Então, a nossa expectativa é que a gente consiga mudar a posição do governo em relação ao projeto.
RDM: E se tiver mobilização popular, isso ajuda, não é?
Gilberto Carvalho: Ajuda muito. Eu acabei de falar isso. Sem a mobilização popular, se não tivesse havido o ‘brec’, nem essa audiência [na Câmara] estava acontecendo.