Vitória de Tarcísio

Após a maioria do plenário da Câmara aprovar o requerimento de retirada de pauta da Medida Provisória (MP) 1303, que alterava a tributação de aplicações financeiras e ativos virtuais no país, e na prática derrotar a iniciativa do governo federal – que tinha que ser votada e aprovada nas duas Casas legislativas até a noite desta quarta-feira, 8 de outubro, para ser transformada em lei e não perder vigência, os líderes governistas acusaram que a derrota foi causada por uma aliança entre o governador paulista, Tarcísio de Freitas (Republicanos), com os presidentes nacionais do PP, senador Ciro Nogueira (PI), e do União Brasil, Antonio Rueda. Nos bastidores, a aliança entre os três – que contou com apoio dos lobistas da Faria Lima – foi fundamental para derrotar o governo. Tarcísio é cotado como candidato ao Planalto, em 2026, e tem na dupla Ciro e Rueda a defesa de que a federação formada por PP e União Brasil apoie sua candidatura.
O artífice da derrota

Mas a reportagem desta coluna apurou que o artífice da derrota do governo Lula com a MP 1303 enterrada foi o presidente nacional do PSD e chefe da Casa Civil do governo paulista, Gilberto Kassab. Kassab, que colocou um pé – desde 2023 – tanto na gestão de Lula, quanto na de Tarcísio, ligou pessoalmente para vários parlamentares do seu partido e também de outras legendas, pedindo o voto contra para rejeitar a MP editada pelo governo Lula com a finalidade de tributar os “Bancos, Bets e Bilionários – BBBs”. Um deputado que recebeu a ligação de Kassab confidenciou que os argumentos apresentados foram que esta iniciativa não foi debatida o suficiente com os agentes do mercado financeiro e, por isso, a ligação. Mas um outro parlamentar disse à reportagem que o principal motivo da ligação era para que Kassab pudesse sinalizar que estava em sintonia com o governador paulista, que se envolveu pessoalmente para derrotar a MP 1303. Pelo sim, ou pelo não, nos bastidores, só se comenta que as ligações de Kassab foram a pá de cal na iniciativa do governo.
R$ 40 bi

Para justificar a pressão que os lobistas da Faria Lima promoveram ao longo das últimas semanas contra a tramitação da MP 1303, os deputados oposicionistas ao governo Lula argumentaram que a arrecadação ao qual o governo federal buscava para equilibrar as contas já tinha sido alcançada com a decisão que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, teve ao manter a cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para alguns casos. De acordo com os parlamentares bolsonaristas, já “ foram arrecadados mais de 40 bilhões de arrecadação com IOF”, além da arrecadação que a referida MP permitiu entrar nos cofres da União nos últimos 120 dias quando a iniciativa vigorou com força de lei.
Respostas do governo

Para dar resposta a derrota na Câmara, fontes ligadas ao Palácio do Planalto e também ao Ministério da Fazenda, disseram que sem a MP 1303, o governo tem a expectativa de arrecadação frustrada em algo de R$ 17 bilhões em 2025, o que pode impor um cronograma apertado de ações para mitigar o impacto no equilíbrio fiscal prometido. De qualquer forma, a resposta do governo precisa ser agir e rápida para superar o episódio. O primeiro passo imediato deve ser realizar um novo bloqueio de despesas no Orçamento de 2025, afetando inclusive emendas parlamentares – uma manobra que tende tensionar ainda mais as relações com o centrão da Câmara e a oposição. Essa contingência visa compensar a perda imediata de R$ 10,5 bilhões previstos para o ano que vem, mas não resolve o rombo maior no horizonte: em 2026, o Executivo terá de captar cerca de R$ 35 bilhões adicionais.
Corte linear

Outra saída defendida, inclusive, pelo líder do governo na Câmara – deputado José Guimarães (PT-CE) – é adotar um corte linear de 10% nas despesas provenientes de todas as subvenções fiscais (isenção de impostos) que o governo entrega a vários setores econômicos para fomentar a economia. Ao todo, o governo deixa de cobrar impostos por conta das subvenções da ordem de R$ 800 bilhões. De acordo com o petista cearense, fazer um corte neste sentido poderia entregar R$ 80 bilhões de folga orçamentária – o que resolveria o problema do cobertor curto e do cumprimento da meta fiscal. O problema é que para mexer nesse “vespeiro”, o governo enfrentaria lobbies tão ou mais ferozes ao demonstrado pelos lobistas do agronegócio, da Faria Lima e das bets, que o governo enfrentou agora na tramitação da MP 1303.
Vitória do setor produtivo

Já o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a não votação da MP 1303 demonstrou que o setor produtivo saiu vitorioso das discussões envolvendo a taxação que o governo queria fazer junto as empresas mais endinheiradas do agronegócio, do sistema financeiro e das empresas que controlam o mercado de apostas virtuais (on line). Ele destacou que não há qualquer justificativa para aumento de impostos, visto que o IOF mantido parcialmente pelo Poder Judiciário já atenuaria a situação fiscal do governo. “A MP já devia ter sido recolhida há muito tempo. Sempre fomos contrários e seguiremos contra qualquer aumento de impostos para o cidadão. O agro e o Brasil mostraram sua força mais uma vez no caminho por um país mais justo”, afirmou Lupion.
Racha no União Brasil

Após a declaração do ministro Celso Sabino (União Brasil-PA) na última sexta-feira, 3 de outubro, fazendo juras de amor ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e afirmando que nada o separará, nem mesmo o seu partido, do apoio à reeleição de Lula em 2026, a executiva nacional do União Brasil decidiu suspender cautelarmente o ministro – deputado federal licenciado – de suas atividades partidárias, além de retirá-lo do comando da executiva regional e dar andamento do processo disciplinar contra ele no Conselho de Ética, que em 60 dias pode resultar na expulsão do parlamentar do partido. Em nota, o presidente nacional da agremiação partidária – Antonio Rueda, afirmou: “O União Brasil reafirma o compromisso com a transparência de suas decisões e o respeito à vontade dos filiados, atuando responsabilidade para preservar a coerência com os seus princípios e valores”.
De saída do União Brasil?

A decisão do União Brasil de tirar o comando do partido no Pará de Sabino e dar seguimento ao processo disciplinar que pode culminar na expulsão do ministro da legenda, agitou os bastidores da política e pode antecipar o mercado da troca de partidos agendado para o próximo mês de março. Sabino estuda as opções para onde pode ir. O presidente Lula teria sugerido que Sabino procure abrigo no PSB do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDICS), Geraldo Alckmin, ou o PDT do ex-ministro da Previdência, Carlos Lupi. Mas a reportagem desta coluna apurou, que Sabino continua dialogando com a possibilidade dele se filiar ao MDB do governador paraense Hélder Barbalho. O que emperra Sabino a se mudar para o MDB é que Hélder não quer o ministro como candidato ao Senado, que é o plano do hoje deputado.
Até a COP

Por outro lado, uma fonte ligada ao União Brasil informou a esta coluna que o apoio dos 46 deputados da legenda para o ministro permanecer à frente do Ministério do Turismo, mesmo contrariando a decisão da executiva nacional que quer sua saída para ontem, é apenas um jogo de cena. Esta fonte garante que as juras de amor que Sabino fez ao presidente Lula na última sexta não passaram de encenação. Para Sabino, que interessa permanecer à frente da pasta pelo menos até a realização da 30ª edição da Conferência sobre mudança no clima (COP-30), que acontecerá em Belém nos dias 6 e 7 e de 10 a 21 de novembro, esse período está dentro do prazo estabelecido no processo disciplinar interno que a executiva nacional do partido está movendo contra ele. Até lá, Sabino terá tempo de recuar e renunciar ao Ministério, o que estaria combinado entre o ministro e a maioria da bancada.
Processo arquivado

Por 13 votos a 4, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados decidiu nesta quarta-feira, 8 de outubro, arquivar o processo contra o deputado André Janones (Avante-MG), que foi afastado do mandato por 90 dias por ofensas homofóbicas contra o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), durante sessão no plenário da Casa. Com a decisão, Janones volta ao exercício do mandato. Na fundamentação para arquivar o processo contra o parlamentar mineiro, o relator do caso no Conselho de Ética – deputado Zé Haroldo Cathedral (PSD-RR) – argumentou que as falas de Janones contra o bolsonarista mineiro se enquadra nos dispositivos constitucionais que garantem “liberdade de expressão”, além das falas terem acontecido em meio a uma “manifestação política”.