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Inteligência Artificial na Saúde Pública: A Viabilidade da Transcrição Automática de Consultas pelo SUS

O comércio pode (e deve) reagir a nova regra de trabalho em feriados.
Dr. Alberto Gonçalves Jr.

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  1. O Brasil enfrenta desafios estruturais na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS). A sobrecarga dos profissionais, a burocracia excessiva e a fragmentação das informações médicas comprometem a eficiência dos atendimentos. A inteligência artificial (IA), amplamente aplicada no setor privado, pode oferecer soluções concretas para esses problemas. Um dos avanços mais promissores é a transcrição automática de consultas médicas. A tecnologia permite registrar, em tempo real, as interações entre médicos e pacientes, garantindo prontuários mais precisos, reduzindo o tempo dedicado à burocracia e ampliando a capacidade de atendimento.

A questão central não é se a IA pode ser usada no SUS, mas como implementá-la dentro dos limites legais, éticos e financeiros. A transcrição automática já é uma realidade em países como Espanha e Estados Unidos. No Brasil, sua adoção exige adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e às normas do Conselho Federal de Medicina (CFM). O Projeto de Lei n.º 2338/2023, que estabelece o marco regulatório da IA, também impactará essa inovação. A boa notícia? Nenhuma dessas barreiras é intransponível.

O médico do SUS enfrenta um paradoxo diário: precisa atender mais pacientes, mas perde tempo excessivo com registros manuais. Segundo dados do Ministério da Saúde, um clínico geral pode gastar até 40% do seu tempo preenchendo prontuários. Essa carga administrativa reduz a qualidade do atendimento, gera fadiga profissional e dificulta o acompanhamento eficaz dos pacientes.

A transcrição por IA elimina essa ineficiência. Com o uso de algoritmos treinados para reconhecer termos médicos, a conversa entre médico e paciente é convertida automaticamente em texto estruturado. O profissional pode revisar e validar as informações, garantindo que o prontuário reflita com precisão a consulta. Isso não substitui o médico, mas fortalece sua atuação, permitindo foco na análise clínica e na tomada de decisões.

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Além disso, a padronização dos registros melhora a interoperabilidade dos sistemas de saúde. Hoje, um paciente atendido em diferentes unidades do SUS muitas vezes precisa repetir exames ou fornecer informações que já constam em outros prontuários. Com a IA, o histórico médico pode ser acessado de forma integrada, otimizando recursos e reduzindo custos desnecessários.

A principal preocupação jurídica gira em torno da privacidade dos dados. A LGPD exige que qualquer tratamento de informações sensíveis tenha uma base legal sólida e adote medidas de segurança para evitar vazamentos. No contexto da transcrição automática, o consentimento do paciente deve ser um requisito inegociável. A implementação de mecanismos de criptografia e controle de acesso assegura que apenas profissionais autorizados possam consultar os registros.

O Conselho Federal de Medicina também impõe diretrizes sobre o uso de tecnologia na prática médica. A Resolução CFM n.º 2.314/2022 estabelece que nenhuma ferramenta pode comprometer a autonomia do médico ou substituir o atendimento humanizado. A IA aplicada à transcrição se alinha a essa exigência porque atua como suporte, e não como agente decisório.

Já o Projeto de Lei n.º 2338/2023 classifica a IA na saúde como de alto risco, exigindo auditoria e transparência nos algoritmos. Isso significa que qualquer sistema adotado no SUS precisará ser auditável, com regras claras sobre a origem dos dados e a supervisão humana. Na prática, isso não inviabiliza o uso da IA, apenas impõe um padrão de governança compatível com a criticidade do setor.

O argumento recorrente contra a modernização do SUS é a falta de recursos. Mas a adoção da IA na transcrição de consultas não exige investimentos exorbitantes. Modelos de código aberto, utilizados em outras áreas da administração pública, podem ser adaptados para o setor de saúde. Além disso, parcerias público-privadas são uma alternativa viável. Grandes empresas de tecnologia já oferecem soluções de IA para hospitais privados – um modelo de cooperação com o governo poderia acelerar a implementação no SUS.

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A transição deve ser gradual e orientada por projetos-piloto em unidades estratégicas. Municípios com maior demanda podem testar a ferramenta em especialidades críticas, como pediatria e atenção primária. Isso permitiria ajustes antes de uma expansão nacional, garantindo que o sistema funcione sem comprometer a qualidade do atendimento.

O SUS precisa evoluir para atender às demandas crescentes da população sem sobrecarregar seus profissionais. A transcrição automática de consultas médicas por IA é uma solução prática, viável e alinhada com as normas jurídicas vigentes. Seu uso não apenas melhora a gestão da informação, mas também reduz custos operacionais e aprimora a experiência do paciente.

A regulamentação brasileira já oferece diretrizes claras para a adoção da IA na saúde, exigindo apenas ajustes técnicos e operacionais. O desafio não é se a tecnologia deve ser adotada, mas sim quando e como será implementada. O SUS tem a oportunidade de liderar uma transformação digital que beneficia pacientes, médicos e gestores públicos. Ignorar essa inovação seria perpetuar um modelo ineficiente e ultrapassado.

 

Alberto Gonçalves Jr. Advogado, formado em Negociação pela Universidade de Harvard, especialista em Inteligencia Artificial e em negociações estratégicas, Secretário Geral da 28ª Subseção, autor de obras jurídicas como “Compliance na Telemedicina”, “A Prova do Assédio Moral no Processo do Trabalho”, “Visões Jurídicas”, e professor convidado em cursos de pós-graduação.

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