35 C
Cuiabá
terça-feira, abril 30, 2024
spot_img

Incêndio no Pantanal provoca releitura sobre o bioma mais frágil do Brasil

“A riqueza da fauna nesse momento é muito prejudicada”,a avallia Mauren Lazzaretti Foto: Christiano-Antonucci

Os incêndios florestais que devastaram mais de 20% do Pantanal, com cerca de 17 mil focos de calor e uma área destruída de quase dois milhões de hectares, fez o Estado acender a luz vermelha. Além do alerta, houve gastos e prejuízos em ambos os lados. O Governo do Estado já investiu mais de R$ 22 milhões de recursos próprios, contando com 40 equipes espalhadas por todo o estado para o combate ao fogo, seis aeronaves, três helicópteros e mais de 2.500 profissionais envolvidos, desde bombeiros militares, voluntários, integrantes da Defesa Civil e das Forças Armadas. Só em 2020 já aplicou R$ 190 milhões em multas relacionadas a incêndios florestais e queimadas ilegais. As autuações foram feitas, por meio dos órgãos que compõem o Comitê Estratégico para o Combate do Desmatamento Ilegal, a Exploração Florestal Ilegal e aos Incêndios Florestais (CEDIF-MT). De quem é a culpa pelos incêndios? Enquanto essa questão se resolve, a secretária de Estado do Meio Ambiente, Mauren Lazzaretti, assegura que o Estado continua à frente da força-tarefa que não apenas busca mitigar os efeitos do fogo, mas preveni-lo no futuro.

O Pantanal de Mato Grosso está em chamas em uma proporção nunca vista. O Estado já identificou os responsáveis por esses incêndios?

A responsabilidade pelos incêndios no Pantanal de Mato Grosso, na verdade, é múltipla. Não há um único responsável. Nós tivemos pelo menos cinco pontos originários dos incêndios florestais que foram conferidos no nosso Pantanal, sendo um deles em terra indígena, a Perigara. Outro foi registrado após um acidente veicular na Rodovia Transpantaneira, além de outros três identificados dentro de propriedades rurais. Temos trabalhado para localizar via imagens de satélite esses pontos originários, averiguar a responsabilidade, coletar dados e punir aqueles que configurarem em infração.

O governador Mauro Mendes prometeu agir com rigor contra os responsáveis pelos incêndios. O que já foi encaminhado nesse sentido?

Só em 2020 já aplicamos 190 milhões de reais em multas relacionadas a incêndios florestais e queimadas ilegais. Vamos continuar com todo o rigor nesse campo de atuação. Temos utilizado não só o mecanismo da tecnologia para identificar a origem, como também para demonstrar o caminho do fogo de forma que dê materialidade a essa infração e que ela não seja cancelada posteriormente por meios jurídicos. Como ainda continuamos nessa tarefa, ainda hoje concentramos esforços no combate aos incêndios, mas na mesma oportunidade o Corpo de Bombeiros tem coletado dados que vão incorporar e permitir as autuações na sequência dos fatos.

Qual será o foco principal da Secretaria de Meio Ambiente nessa questão?

A prioridade da Secretaria de Meio Ambiente, em conjunto com o Corpo de Bombeiro e com o Batalhão Ambiental da Polícia Militar é materializar as infrações para punir os culpados exemplarmente ainda no ano de 2020 e não só lavrar o auto de infração. Estamos realizando uma força-tarefa para que esses autos sejam julgados no prazo regulamentar e não mais em cinco ou seis anos como acontecia em gestões anteriores. O objetivo das multas é fazer com que o infrator sinta o efeito pedagógico dessa penalidade e não seja mais um reincidente em anos seguintes.

O objetivo das multas é fazer com que o infrator sinta o efeito pedagógico dessa penalidade e não seja mais um reincidente em anos seguintes

Boa parte do Pantanal é atribuição federal. Já existe parceria com a União para preservação ou será necessário decretar situação de emergência para obter recurso destinado à recuperação do bioma destruído pelo fogo.

Estamos trabalhando dentro dos comitês estratégicos que existem no Estado de Mato Grosso, nas ações de combate a incêndios florestais e já estamos juntamente com a Embrapa, a Universidade Federal de Mato Grosso e Universidade de Mato Grosso estabelecendo um grupo de trabalho que possa organizar ações que venham mitigar e melhorar a situação do Pantanal no pós-pandemia da Covid-19 e também após essa fase crítica de incêndios.

Além de rigor no cumprimento de leis, o que falta para que situações como essa não se repita nessa proporção?

Em primeiro lugar, acho que situações como a vivida no ano de 2020 não refletem unicamente a questão de cumprimento das leis, tampouco a situação preventiva tão bem desenvolvida pelo Estado. Temos um agravamento, sem dúvida alguma, pelas condições climáticas. Aí é óbvio que a discussão das políticas de mudanças climáticas, como Mato Grosso faz a mais de 10 anos, é muito importante e deve ser ampliada não só para outros estados brasileiros, mas para o mundo. Precisamos fortalecer, de fato, a política de pagamento por serviços ambientais para que áreas como o Pantanal, Amazônia, Cerrado, enfim, todos os biomas que tem uma importância muito grande para o planeta possam ser conservados e preservados.

Mas ainda há preconceito em relação a esses pagamentos.

Sim. Ainda temos uma carência muito grande de políticas públicas nesse sentido. Existem muitas cobranças, mas é importante que políticas de pagamento por serviços ambientais saia do papel e se torne uma realidade. Isso pode mudar o cenário.

A riqueza da fauna nesse momento é muito prejudicada e não há como não se sensibilizar com a imagem de um animal queimado

Fora isso, há mitos a respeito da presença humana no bioma pantaneiro e a sua utilização econômica para a pecuária, por exemplo.

Por isso precisamos fazer um enfrentamento de alguns mitos que nós temos a respeito da utilização do Pantanal, de como fazer o manejo adequado do fogo, da utilização de tecnologia como retardante, só para citar alguns. No caso do retardante, ainda há um preconceito muito forte quanto ao seu uso, mas já existem muitos produtos no mercado que se preocupam com a condição ambiental. Destaco, ainda, que temos que amadurecer nas técnicas de prevenção e combate aos incêndios florestais, além de incrementar a discussão da política de mudanças climáticas. Se trata de um pacote muito amplo a ser observado, discutido e deliberado.

Sabe-se que raios e reflexos de vidros também provocam queimadas em vegetação seca. No entanto, o homem é o grande responsável. No processo de conscientização o setor turístico e os próprios pecuaristas são fundamentais?

A conscientização deve ser geral. Temos desde pequenos produtores ao pecuarista e do turista ao morador urbano. São variáveis as causas desses incêndios. Temos que observar que muitos desses incêndios iniciaram em terras indígenas, no Pantanal e na Amazônia. Por conta disso, precisamos fazer uma discussão qualitativa com os indígenas para que nesse período de estiagem,  período em que a gente acaba proibindo o uso do fogo, que eles também possam fazer a queimada de forma controlada ou abolir por determinado período a tradição desse fogo. É preciso considerar que parte desse enorme prejuízo causado pelos incêndios é imposta aos próprios indígenas. No Pantanal, por exemplo, um dos grandes incêndios teve início na Terra Indígena Perigara e avançou para outras regiões do Pantanal.

O incêndio no Pantanal não causou apenas prejuízos à natureza. Causou comoção na sociedade. Como definir esse sentimento de perda?

Os incêndios, de um modo geral, causam comoção. No ano passado vimos a mesma sensibilização mundial em razão do fogo na Amazônia e o no próprio Pantanal, que é Patrimônio da Humanidade. Então, sem sombra de dúvida, por ser um bioma tão raro, tão único por abrigar a maior fauna conhecida na biodiversidade, essas imagens chocam certamente. Qualquer ser humano se comove com as imagens tristes e lamentáveis que vimos no Pantanal. Principalmente porque se trata de um incêndio sem precedentes naquela região. A riqueza da fauna nesse momento é muito prejudicada e não há como não se sensibilizar com a imagem de um animal queimado. Então, toda essa contrariedade reflete a importância que o Pantanal tem para a sociedade.

Há uma estimativa de tempo para a recuperação da área queimada e o seu repovoamento pela fauna?

Não há ainda, nesse momento, a possibilidade de se fazer um balanço geral de todos os danos, tampouco de qual será o comportamento. Temos a expectativa de que os pesquisadores que estão agora no Pantanal, que estudam o bioma com regularidade, que eles possam nos auxiliar nesses estudos. Inclusive, na adoção de medidas que possam contribuir para esse repovoamento e para a recuperação da flora local. Para isso, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente já contatou a Embrapa Pantanal que tem muita expertise no comportamento da região com pesquisas por várias décadas. Fizemos contato também com a nossa Universidade Estadual, a Unemat, e também com a Universidade Federal de Mato Grosso com o objetivo de nos apoiar em ações futuras. Essas medidas visam orientar a comunidade pantaneira e científica, além mostrar aos voluntários a forma correta de empreender de modo a auxiliar na recuperação do ambiente pantaneiro.

Clique aqui e entre no grupo RDM no Whatsapp

Latest Posts

ÚLTIMAS NOTÍCIAS