Jean Gusmão
Esta semana a morte do Golden retriever Joca comoveu e revoltou todo o Brasil. Joca morreu por um erro da companhia área Gol. Na segunda-feira (22.03), o Joca deveria embarcar, junto com seu tutor João Fantazzini Júnior, em um voo da Gol de São Paulo para Sinop (500 km de Cuiabá). Os dois estavam de mudança para Sorriso.
Ao invés de seguir para Sinop, o cão de cinco anos foi mandado por engano para Fortaleza. Lá, ele ficou 1h30min na pista de embarque e desembarque, com temperatura de cerca de 36° C, segundo a família, dentro do canil, sem comer. Depois disso, Joca embarcou de volta para São Paulo, onde chegou morto.
“Não tem ninguém que aguente uma pista aérea com 36°C de sol. Ele fechado na caixa. Não tiraram ele da caixa, ele voltou todo molhado”, contou João à TV Globo. Segundo João, foi apresentado à companhia aérea um atestado veterinário que indicava que o animal suportaria uma viagem de duas horas e meia. Com o erro da empresa, porém, Joca ficou quase 8 horas no trajeto.
Abril Laranja
O caso que está emocionante e mobilizando todo o Brasil, inclusive o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, aconteceu justamente no mês escolhido para prevenir a crueldade animal. O Abril Laranja tem o objetivo de conscientizar a população sobre seu papel na proteção dos animais domésticos. A Sociedade Americana para a Prevenção da Crueldade a Animais (ASPCA) criou a campanha Abril Laranja para lembrar que a vida dos animais também deve ser preservada. A campanha foi lançada em 2006, nos Estados Unidos e envolve iniciativas em várias áreas, como distribuição de cartilhas, realizações de palestras e eventos com presença de animais e reforço na divulgação de canais para denuncias de maus tratos.
Devido ao sucesso e às necessidades, o modelo foi trazido para o Brasil, onde o abandono de animais é crime desde 1998, de acordo com a Lei 9.605/98. Em 2020, com a aprovação da Lei 14.064/20, teve-se o aumento da pena de maus-tratos, com reclusão de dois a cinco anos, multa e proibição da guarda quando se tratar de cão ou gato. O conselho Federal de Medicina Veterinária, por meio da Resolução 1.236/2018, define como maus-tratos “qualquer ato, direto ou indireto, comissivo ou omissivo, que intencionalmente ou por negligência, imperícia ou imprudência provoque dor ou sofrimento desnecessário aos animais”.
Em Cuiabá, ONGs como a AVA (Associação Voz Animal), Projeto Lunaar, É o Bicho, Opa, entre outras, trabalham no resgate de animais que se encontram em situação de abandono nas ruas ou que sofrem crueldades e violência doméstica por parte de quem deveria amar e proteger, os tutores.
No entanto, a presidente da AVA, Maria das Dores Gonçalves da Silva, conhecida como Dora, enfatiza que os maiores problemas relacionados aos maus-tratos dos animais domésticos decorrem da falta de consciência das pessoas ou famílias que decidem adotar um animal. Às vezes, ao invés de cuidarem deles, acabam os abandonando nas ruas urbanas.
“O grande problema dos animais é o abandono e a falta de consciência por parte das famílias e das pessoas que atuam como tutores desses animais. Não há essa consciência de que têm a responsabilidade sobre o animal até o fim da vida dele. Se não puderem mais cuidar, é necessário encontrar outro tutor para o animal ou passar sua responsabilidade para alguém, ao invés de abandoná-lo à própria sorte”, pontua Dora.
Dora reforça que a solução requer mais campanhas de conscientização de forma contínua. Além disso, é necessário realizar estudos e pesquisas para determinar a quantidade de animais em Cuiabá e Várzea Grande, visando a implantação de chips nos animais, juntamente com o cadastro dos tutores.
Chipagem
Uma solução seria uma campanha de conscientização muito bem elaborada e permanente sobre a posse responsável dos animais. Realizar um censo animal em Cuiabá e Várzea Grande para determinar quantos animais existem e implementar a chipagem para identificar os tutores dos animais, possibilitando uma responsabilização eficaz. Quando um animal abandonado for resgatado, seria possível identificar seu tutor e responsabilizá-lo pelos maus-tratos e pelo abandono”, acrescenta.
Ela reforça que o Poder Público, seja municipal ou estadual, está notavelmente ausente em relação à questão dos cuidados aos animais domésticos. No entanto, nos últimos tempos, tem havido um apoio significativo por parte do poder judiciário e do poder legislativo do estado, que têm contribuído para a luta pela causa animal. Além disso, acrescenta que as leis existentes são insuficientes, havendo muitas falhas em seu cumprimento.
Portanto, para manter a associação, Dora destaca que contam com doações de voluntários e membros da diretoria que fazem parte da associação. Maria ressalta ainda que, após vinte anos de existência, começaram a receber verbas de emendas da Assembleia Legislativa de Mato Grosso.
“As ONGs se mantêm com doações de voluntários e das próprias diretorias, que as mantêm funcionando. Além disso, recebem alguma doação do poder judiciário, do Ministério Público do Meio Ambiente e de emendas parlamentares. Pela primeira vez em 20 anos, recebemos a primeira doação para a AVA; as outras ONGs nunca receberam”, finaliza Dora.
OAB
Por outro lado, a Ordem dos Advogados de Mato Grosso tem se dedicado às causas animais por meio da Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais. A comissão está ativamente envolvida na conscientização da população sobre a causa animal, especialmente através das redes sociais. Seu objetivo é promover ações fundamentais para educar as pessoas sobre a importância do respeito e do cuidado com os animais, além de incentivar uma mudança de atitude em relação aos direitos dos animais. Ao envolver a comunidade de forma proativa e educativa, a comissão busca promover uma cultura de respeito e proteção aos animais.
“A Comissão, ela atua em cima da conscientização da população através das redes sociais. A gente acompanha os Projetos de Leis, todo que envolve a causa animal, e gente sempre está divulgando nas nossas redes. Nos faz palestras em escolas, também levando um tema as situações de cuidados básicos com os animais e conscientização sobre os maus tratos” pontua a presidente da Comissão, Carla Fahima.
Carla afirma que as denúncias de maus-tratos não chegam até a Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais da OAB-MT. No entanto, ela menciona que o órgão tem trabalhado em colaboração com a delegacia, acompanhando alguns casos emblemáticos que ocorreram no estado.
“A comissão, ela acaba não recebendo situações diretas de maus tratos. A gente fala, pra gente conseguir atuar, as informações têm que chegar até nós e precisa ser provado. Mas vemos através da mídia alguns casos emblemáticos e estamos sempre acompanhados junto à delegacia do Meio Ambiente” acrescenta.
Carla afirma que acompanha de perto os trabalhos voltados para a causa animal, em parceria com os órgãos públicos, e atualmente faz parte da comissão setorial na Assembleia Legislativa. Ela ressalta que os órgãos fiscalizadores enfrentam falta de recursos para destinar à causa animal.
“A gente acompanha o trabalho que hoje tem aqui em Cuiabá, nos estamos sempre em contato com Órgãos Públicos. A gente faz parte da Comissão Setorial Temática da Causa Animal da Assembleia Legislativa, que o deputado Max Russi. Infelizmente em Cuiabá, existem o órgão fiscalizador, e ele é pouco eficiente. Acredito, que seja por falta de recurso, não tem recurso destinado principalmente pra causa animal, e a demanda em Cuiabá e muita alta” finaliza.
Prefeitura de Cuiabá
Na Prefeitura de Cuiabá, a Secretaria Adjunta de Bem-Estar Animal, vinculada à Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano Sustentável é que trata da situação de abandono ou maus-tratos aos animais.
De acordo com a Secretaria, as principais ocorrências atendidas são atropelamento e abandono de animais por pessoas que mudam de residência. “A maior dificuldade tem sido localizar as pessoas que cometeram os maus tratos. A equipe vai ao local, verifica a casa em que morava a pessoa. Ninguém fornece informações sobre a identidade da pessoa ou do dono do imóvel, e muitas vezes é necessário acionar o IPTU ou a polícia, o que demanda tempo”, explica Tatiana Soares, secretária adjunta de Bem-Estar Animal.
Tatiana destaca que a função da secretaria adjunta é punir quem comete os crimes de maus-tratos ou abandono dos animais para responsabilizá-las. “Trata-se de um crime ambiental com pensa aumentada, sendo prisão de até cinco anos e multa pesada”, ressalta.
Para tentar diminuir os casos, a Prefeitura de Cuiabá realiza constantemente trabalhos de conscientização e para celebrar o Abril Laranja, haverá uma programação nos dias 29 e 30 deste mês, das 9h às 18h, na Praça Alencastro. Na ocasião, o Centro de Zoonoses ofertará a vacinação antirrábica para cães e serão disponibilizadas guias para castração gratuita para pessoas de baixa renda. Haverá ainda doação de mudas de árvores e feira gastronômica e artesanal.
Joca – Um Símbolo
A esperança dos defensores e amantes dos animais é Joca torne-se um símbolo de mudança. Ongs e autoridades estão pedindo alterações nas regras de viagens para pets em aviões. As empresas aéreas não permitem que os animais, principalmente os de grande porte, viagem junto com seus tutores dentro da cabine. Os pets tem que viajar em caixas de transportes de animais junto com a bagagem. Os animais são transportados como cargas e não como seres vivos.
A Gol informou que suspendeu o transporte de animais por 30 dias para analisar a situação. A primera-dama do Brasil, Janja da Silva chamou o caso de “irresponsabilidade” da Gol. Na quarta (24), em um evento, o presidente Lula usou uma gravata com figuras com desenho de cachorros em homenagem a Joca. O Ministérios dos Portos e Aeroportos e ANAC (Agência Nacional de Aviação) vão investigar o caso. O Ministério da Justiça pediu esclarecimentos à Gol. Talvez Joca não tenha ido em vão, e ainda ajude a milhares de animais por todo Brasil.