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quinta-feira, maio 9, 2024
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O Nosso Carro de Boi e os Bois

Por Ademir Galiztki

Só bem depois de grande que fui entender o porquê era preciso de tantas juntas de bois para dar conta e puxar o carro de boi. Na verdade, não era exatamente devido ao peso da carga, mas sim para o dono mostrar a quantidade de bois e o poder como proprietário de juntas de bois. Pois, dependendo do tamanho da carga, uma junta de bois já era suficiente. Com muitas juntas de bois a puxarem o carro, o dono dos bois era mais bem visto e os bois eram muito mais valorizados. Eu, em particular, gostava mesmo era de ouvir os nomes dos bois e de saber que cada boi tinha sua posição certa em cada comando. Tinha um detalhe: em cada dupla de bois, era colocado um boi experiente e um aprendiz, e logo esse aprendiz se tornava líder e ia ensinando aos menos experientes. Outro detalhe: o boi se acostuma com um só tocador; quando é trocado, os bois acabam não rendendo. Tem até a letra linda de uma música do Trio Parada Dura onde conta que a moça que tocava e comandava as juntas de bois veio a falecer, e os bois só voltaram a trabalhar na hora de levar a moça para sua última morada, ou seja, para o cemitério.

Neste intervalo em que a moça ficou enferma, no hospital e depois em repouso em casa, os bois se recusavam a puxar o carro. Só iam se a moça saísse na janela e desse ordens para os bois carregarem. Depois, a moça teve uma recaída e veio a óbito, baseado em histórias reais. Agora, a passagem que eu mais gosto dentro deste mundo maravilhoso do carro de boi, das tropas, das comitivas, etc.: Vamos dar nomes aos bois!

Primeira Dupla: Rochedo e Xavante. Segunda: Passaredo e Bacharel. Terceira: Coronel e Embaixador. Quarta: Fagulha e Faísca. Quinta: Malhado e Trocador. Sexta: Valente e Barroso. Sétima: Talento e Viajante. Oitava: Negrão e Faceiro. Nona: Bandido e Herói. Décima: Curiango e Passarinho.

E tinham os donos destas valiosas boiadas. Eu tinha o costume de colocar os bois sempre predominando as cores: às vezes todos brancos, às vezes todos pretos, às vezes malhados, outros vermelhos, outros baios. E os bois mais experientes sempre ficavam em lugares estratégicos, dependendo das curvas que iriam ter naquele percurso. E tinham também os bois espertinhos que se escoravam em outros, dependendo da posição que ficavam na fila.

O principal treinamento para formar tais bois era criterioso. O início das atividades era puxando pneus de caminhão. Só depois de bem treinados e práticos é que iriam puxar o carro de boi. E, em particular, tenho muitas saudades e boas lembranças daqueles bons e velhos tempos quando íamos buscar lenha, milho, abóbora, capim elefante ou capim naipe, batata doce, arroz, feijão, erva-mate, barro ou argila para construir casas de taipa ou casa de barro, vários tipos de madeiras ou bambu, e palha para construir algumas casas na colônia, nas fazendas que meu pai tomava conta como administrador.

Outras vezes, a gente usava o carro de boi somente para passear, pescar, especialmente em festividades como carreatas e procissões religiosas. Também tinham os campeonatos de carro mais bonitos, mais enfeitados, tipo carro alegórico, tipo carnaval. E a quantidade maior de bois puxando os carros de bois, um dos maiores sucessos já de muitos tempos, é o famoso e tradicional conto das rodas dos carros de bois. Canta de um jeito e tom quando sobe uma subida muito íngreme; quando está descendo, tem outro tom; e quando está em uma estrada ou caminho plano, tem outro tom.

Todo bom carreiro preza de sua chamada ferrão, toda trabalhada e com detalhes na sua ponta, perfurante e aguda, mas não é para ferir os bois, é para os tocadores terem consciência e não os ferir. E muitas vezes, os bois entendem pelo jeito de falar, jeito de gritar, num jeito carinhoso de tratar a boiada e os bois.

Agora, só restam saudades, e ainda bem que a saudade não mata, só machuca.

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