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sexta-feira, junho 14, 2024
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O necessário respeito

Em tempos nebulosos como os que estamos vivendo atualmente, torna-se fundamental o resgate de um valor que deveria imprimir cada momento de nossa existência, mas que tem sido deixado de lado há tempos. O respeito.

A palavra ‘respeito’ vem do latim respectus, que é o particípio passado do verbo respicere, que significa “olhar outra vez”, cuja origem, por sua vez, tem origem em re, que quer dizer “de novo”. À essa partícula se une specere, “olhar”.

Logo, o fato de olhar outra vez pode garantir a percepção mais clara daquele ou daquilo que está a se olhar. Este segundo olhar permite e/ou garante uma melhor compreensão do que se olha e, disso, resulta a necessidade de que esse fato seja respeitado por conter, em si mesmo, um valor implícito.

Muitas vezes, o olhar que se lança sobre alguém ou sobre algo não é acompanhado deste outro e necessário olhar, impossibilitando compreender o valor implícito desse fato e/ou fenômeno. Assim, é essencial que tenhamos em mente a noção clara de que cada pessoa merece ser olhada com mais atenção e cuidado, para garantir que ela seja percebida como alguém dotado de um valor próprio e, portanto, de uma dignidade, que é a razão maior do respeito que devemos ter por ela.

Isso é o que deveria acontecer, mas…

O Brasil tem assistido, especialmente nas duas últimas décadas, e com mais intensidade nestes dois últimos anos, o exacerbar daquilo que nega o respeito e acentua o ódio gratuito sem nenhuma consideração ou motivação. Basta uma simples não concordância, ou seja, não estar de acordo com o que alguém pensa e acredita para receber de volta uma saraivada de impropérios, desacatos e até violências de várias naturezas.

Algumas vezes, esse ódio é disfarçado com algumas palavras, como se tentando dourar uma pílula amarga e venenosa, entretanto sem esconder o fato em si, a agressão sub-reptícia, camuflada. Dessa forma, por esse meio e por outros meios que vão muito além de uma simples objeção, a agressão é evidente, desbragada, virulenta e carregada de uma odiosa fúria verbal ou escrita.

Por que tanto ódio gratuito? Isso nos levará aonde? Certamente a um lugar onde não seremos felizes e a paz não será uma presença, sequer eventual. O que fazer?

Penso que a primeira atitude, que é um comportamento ditado por disposição interior, ou seja, a vontade determinada de combater esse ódio. E ódio não se combate com mais ódio, muito menos com confrontações, mas com respeito àquilo que o outro pensa, mesmo que esse modo de pensar desse outro seja o inverso do que pensamos. Aceitar o outro em suas diferenças, crenças, ideologias, idiossincrasias ou qualquer outra manifestação de comportamento, é a atitude primeira para dar início a uma cruzada contra o discurso do ódio.

Em tempos nebulosos como estes, torna-se fundamental resgate do respeito

Cito como exemplo o Movimento Contra o Discurso do Ódio, lançado pelo “Sector de Juventude do Conselho da Europa”, elaborado por jovens em 2017, tendo como finalidades: Sensibilizar para o discurso de ódio online e seus riscos para a democracia e promover a literacia (Capacidade de ler, de escrever, de compreender e de interpretar o que é lido; letramento, alfabetismo.) nos meios de comunicação social e na internet;

Apoiar os jovens na defesa dos direitos humanos, online e offline; Reduzir os níveis de tolerância ao discurso do ódio online; Mobilizar e formar jovens ativistas de direitos humanos para trabalhar online; Mostrar apoio e solidariedade para com pessoas e grupos alvos do discurso do ódio online; Desenvolver formas de participação da juventude e a cidadania digital.

No Brasil, o que está sendo feito para combater essa explosão odiosa que se manifesta a partir das falas do Presidente e de seus seguidores? O que se percebe é uma exacerbação de conflitos ideológicos imotivados, porque, assim penso, o ódio não é justificativa para se conquistar ou se manter no poder, muito menos para se construir uma Nação.

Até mesmo as famílias acabam sendo esfaceladas, não por diferenças religiosas ou práticas culturais tradicionais, mas pela insistente confrontação de “nós contra eles”, sendo que esses “eles” somos nós mesmos visto pelo olhar do ódio, de um negacionismo abjeto, desprovido de qualquer conteúdo minimamente aceitável.

E assim estamos indo, ladeira a baixo, em direção a uma sociedade incivilizada, onde harmonia será encontrada apenas nos livros de história. Não estou sendo pessimista, apenas chamo atenção para um fato sociológico que se encontra em plena expansão e que necessita urgentemente ser combatido e impedido de prosperar.

Reitero a ideia de que ódio não se combate com ódio. Lembremos o exemplo edificante de Nelson Mandela, para ficarmos em fatos históricos recentes. Para os que se assumem como religiosos e crentes em um Deus onipotente e onisciente, basta refletir sobre os ensinamentos da religião, seja ela qual for, até porque TODAS as religiões pregam uma mesma e única coisa, tornar-nos pessoas melhores, sendo esse ‘melhor’ em seu sentido maior.

É difícil? Costumo dizer que difícil é aquilo que ainda não sei, mas se tentar aprender e apreender como modo de vida, tudo ficará fácil e exequível. E o caminho que se desponta em nossos horizontes se resume em uma única palavra – RESPEITO.

Dessa forma, respeitar o outro como legítimo outro e com as mesmas e iguais condições de possibilidades que cada um de nós temos, certamente caminharemos para uma sociedade civilizada e dotada de uma sociabilidade plena, que, só assim, poderemos garantir aos nosso descendentes um Brasil de paz, concórdia e RESPEITO.

Essa odiosa prática do discurso de ódio se espalha como plumas ao vento e está atingindo todos os setores da vida brasileira. Na política (se é que se pode chamar isso de política), esse conflito/confronto atinge até mesmo o interior de muitas famílias, que agora desatam os nós fraternos que as uniam antes, causando um esgarçamento temerário dos elos familiares.

E se atinge o interior de uma família, mais ainda os liames que constituem o tecido social, colocando em risco a própria sociedade organizada, que se vulnera a cada dia.

É por essa razão que convoco/convido os brasileiros sensatos a envidarem esforços para o resgate do RESPEITO como prática cotidiana do nosso viver, contrapondo de forma clara aos assaques que todos sofremos, emanados da tantas bocas irresponsáveis.

José Pedro Rodrigues Gonçalves é doutor em Ciências Humanas

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