Município, que está completa 270 anos neste 19 de março, é pólo turístico, campeão na produção pecuária e avança vertiginosamente na agricultura
Por João Negrão, da Editoria
Prefeito de Vila Bela da Santíssima Trindade em seu segundo mandato, omédico Jacob André Bringsken, ou simplesmente André Bringsken, está muito empolgado com o momento que vive o seu município. Da vocação para o turismo ecológico à produção agropecuária, que se consolida como campeã, a cidade será o ponto de partida para uma das saídas para o oceano Pacífico, sonho que começa a se tornar realidade. Vila Bela será positivamente impactada com esse corredor de exportação e importação. Estes são alguns dos temas desta entrevista, na qual André Bringsken faz um resgate da história de Vila Bela, a antiga capital de Mato Grosso.
Prefeito, fala pra gente um pouco sobre a história da primeira capital de Mato Grosso.
Sim. Eu nasci em Vila Bela. A história é muito linda. Onde eu posso e conto e as pessoas se impressionam, porque é uma história desconhecida para a maioria dos brasileiros. O Brasil hoje tem essa dimensão continental graças a Vila Bela. Porque foi o ponto mais avançado a Oeste, da quebra do Tratado de Tordesilhas. É importante dizer que Vila Bela foi a primeira cidade planejada e construída no Brasil. As cidades cresciam em torno do poder, em torno da igreja, E Vila Bela não. O mapa veio debaixo dos braços de Dom Antônio Rolim de Moura, que era primo do rei de Portugal, D. João V; quando veio para o Brasil e com a ordem de construir Vila Bela. E aí as histórias são de 1752.
Vila Bela ficou como capital do Estado de Mato Grosso e experimentou um grande desenvolvimento. Nós tínhamos ali a casa da fundição da moeda, tínhamos teatro, tínhamos a catedral, que ainda existe até hoje, o palácio dos governadores, chamados capitães generais na época. Mato Grosso tem esse nome hoje em função do Vale do Guaporé, que os dois irmãos, Arthur e Fernando Paes de Barros, escreveram ao rei de Portugal que haviam chegado numa região de mato muito grosso, onde 12 homens não conseguiam abraçar uma árvore de modo que tão denso e grosso que era.
Prefeito, o senhor lembrou que a Vila Bela foi uma cidade planejada e há um registro histórico de que o seu mapa serviu de Lisboa, quando a capital portuguesa foi destruída por um incêndio em meados do século XVIII…
Sim! Tem essa história e serviu de inspiração para a planta de Nova Iorque também. É importante lembrar que Vila Bela nasceu da ideia da cidade planejada no início da cidade moderna, no modernismo. Pascoal Moreira Cabral foi o arquiteto, foi um dos fundadores. E aí nós começamos a entender algumas das razões pela transferência da capital para Cuiabá, porque a Vila representou naquela época o que Brasília representou nos anos 60, uma cidade planejada. Vinham companhias de teatro, engenheiros e arquitetos para conhecer a cidade planejada.
A riqueza era muito grande; a riqueza histórica, a riqueza mineral, porque os portugueses descobriram o ouro na terra. E logo o Brasil colônia, junto com o império, investiram em Vila Bela. Foi tanto que o primeiro capitão general, o primeiro governador, Dom Antônio Rolim de Moura – e aí é importante dizer que era Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Acre, tudo isso era a Província de Mato Grosso na época – construiu várias cidades e foi convidado, quando Dom João Vmorreu e Dom João VIassumiu, para ser o primeiro vice- rei do Brasil, com nome Conde de Azambuja. Ele recebeu essa condecoração. Então ele saiu de Vila Bela direto para servir como rei de todo o Brasil.
Fomos capital de Mato Grosso durante 83 anos e os dois últimos governadores não pisaram em Vila Bela, porque vale entender que Cuiabá tinha um vínculo muito forte, politicamente falando, e a Igreja Católica – como ela trabalhava contra a ideia do modernismo, porque o modernismo pregava a separação da igreja e do estado, começou a trabalhar contra essa escola modernista e tinha que trabalhar contra Vila Bela – começou a trabalhar para Cuiabá ser a capital do Estado.
Mas a coroa portuguesa amava Vila Bela e nunca deixou transferir. A transferência da capital para Cuiabá só ocorreu na época que Dom Pedro I foi chamado de volta para Portugal. Dom Pedro II era muito novo e se instituiu um governo regente. E foi nesse governo regente, em 1835, que se transferiu a capital para Cuiabá e aí é interessante dizer que Vila Bela passou a sofrer um abandono total com a transferência, porque a elite trouxe para Cuiabá apenas os escravos que poderiam transportar a mercadoria, que eram jovens. Deixaram para trás os velhos, as mulheres e as crianças. E ai os negros e escravos que ficaram em Vila Bela – antes da lei do ventre livre, antes da lei dos sexagenários e bem antes da lei da abolição da esravtaura – eram já eram livres.
Ou seja, a libertação, a abolição, aconteceu automaticamente com a transferência…
Sim, mas não no sentido que eles, a elite, queriam isso, mas pelo abandono. Só que os que foram abandonados se organizaram em sociedade. E tem um lance muito interessante. Quando Vila Bela fez 200 anos de existência, portanto no século passado, em 1952, o então governador Fernando Correia da Costa recebeu a visita de Assis Chateaubriand, que era senador da República pela Paraíba e era um magnata que detinha todo império de rádio e jornal e era amigo do pessoal do Getúlio Vargas [na época presidente da República]. Fernando Corrêa da Costa convidou Chateaubriand para visitar Vila Bela, achando que chegaria e encontraria uma cidade fantasma. Quando chegaram lá encontraram uma sociedade negra organizada, sem nenhum analfabeto, do maior ao menor todos sabiam ler, sem ter escola oficial, tamanha era a altivez do nosso povo, os heróis que heroicamente permaneceram lá e garantiram o terrorito no Brasil.
Isso é um importante reconhecimento porque essa comunidade negra garantiu que ali tivesse a expansão territorial brasileira para além além de Tordesilhas, como o senhor relatou no início da entrevista.
Sim! E toda a oportunidade que eu tenho de falar eu falo que Mato Grosso tem uma dívida histórica com a população de Vila Bela. Você sabia que a Assembleia Legislativa votou um projeto de lei para extinguir o município de Vila Bela?
Não sabia. Quando?
Graças a Deus o governador da época vetou. Assim que transferiram a capital para Cuiabá, em 1.835. O governador vetou, mas não satisfeitos eles mudaram o nome de Vila Bela. Eles queriam riscar Vila Bela do mapa e transformaram o nome para Mato Grosso, cidade de Mato Grosso. E assim foi durante décadas. O deputado Ailton dos Reis foi quem mudou de volta o nome para Vila Bela da Santíssima Trindade nos anos 60.
Que história sensacional. Fale também dos outros aspectos turísticos de Vila Bela. Tem o rio Guaporé, que é espetacular; tem a serra de Ricardo Franco; tem a própria cidade, as ruínas da catedral. Enfim, mas fale um pouco.
Nós estamos transformando agora um museu para dentro do Palácio dos Capitães Generais. Nós temos centenas de cachoeiras, são cachoeiras ainda não descobertas e visitadas. Porque você sabe que existe hoje – e pelo Google você consegue ver – os pontos mais visitados são a Cascata dos Namorados, a cachoeira do Cascatinha, que são próximas uma da outra, o cânion, o Jatobá, o poço azul do Jatobá e a própria cachoeira do Jatobá, que é a mais alta de Mato Grosso, com 250 metros.