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sábado, maio 18, 2024
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Apropriação privada de bens públicos

Há diversas formas de usurpar os bens públicos em benefício próprio. A corrupção é apenas uma delas, a mais afamada, mas longe está de ser a mais usual. Há também as famosas rachadinhas muito comum nos gabinetes dos filhos do presidente. Mas, a corrupção republicana tem ainda muitas outras facetas.

De forma geral, se acredita que os políticos ganhem fortunas através da venda de bens e serviços ao Estado ou ao governo, principalmente através de empresas que prestam serviços ou fornecem material superfaturado, e com isso financiam campanhas políticas ou mesmo forneçam benesses aos políticos associados aos negócios empresariais. Ainda que isso sempre aconteça e não há governo que esteja imune a esse vício político e econômico, o mesmo é mais comum num país como o nosso, onde os políticos não são controlados pela sociedade civil, que alienada, pouco vigia a atividade governamental e estatal.

Onde há maior controle social, menor é a atividade corrupta. Onde é maior a omissão da sociedade civil, maior é a roubalheira

Onde há maior controle social, menor é a atividade corrupta. Onde é maior a omissão da sociedade civil, maior é a roubalheira. A imprensa em parte consegue inibir tais práticas, assim como denunciá-las ao público para que cesse tais atividades, ou pelo menos a iniba. Mas, não basta a imprensa, é preciso uma pressão social constante para inibir a prática da corrupção de forma mais contundente.

Entretanto, há uma forma muito mais comum e menos perceptível de se apropriar dos bens públicos em causa própria. A mais comum é usar as verbas públicas para viagens, propagandas, campanhas e desfrute de mordomias através dos recursos destinados aparentemente para as atividades políticas. Financiando os servidores de privilégios e luxos no seu cotidiano.

É o caso do nosso presidente. Desde que assumiu o poder, Bolsonaro está em campanha eleitoral, viajando pelo país, fazendo inaugurações, participando de formaturas, passeando de helicóptero, jet-ski, cavalo, moto, enfim, causando grandes custos com os meios de locomoção e com a sua segurança. Por exemplo, na inauguração de uma ponte de madeira de 18 metros no norte do país e de uma agência da caixa econômica em Santa Catarina, se gastou mais com a locomoção da comitiva presidencial e com a sua segurança do que com os custos da ponte e da agência. Ou seja, gasta-se mais no passeio presidencial do que com o suposto benefício promovido ou inaugurado pelo governo federal.

E o presidente não economiza nesses seus deslocamentos, semanalmente gasta uma fortuna em aviões, carros, helicópteros, motocicletas, cavalos, enfim, com as diversas formas que ele utiliza para aparecer. Numa simples e aparente inofensiva motociata promovida por Bolsonaro, só em segurança tem um custo astronômico, pois tem que fazer a vigilância, e colocar agentes por todo percurso, e fazer controle do tráfego de pessoas e veículos, e usar muito agentes disfarçados para vigiar o povo. Só em diárias e pessoas os custos são estratosféricos. E como ele fica passeando pelo país indo aos locais mais distantes e sempre com grandes comitivas, para garantir um público grande às suas aparições, com toda parafernália para parecer grandioso, carro de som, câmeras de televisão (estatal), cortejos, ou seja, custos, pois nada é de graça, percebe-se o quanto ele gasta em benefício próprio e em detrimento de todos nós.

Pouco vemos Bolsonaro trabalhando, ou está falando para o seu público particular, ou ofendendo a imprensa, ou está se locomovendo pelo país, para parecer um realizador, quando na verdade pouco ou nada faz, e mais inaugura obras que iniciaram antes dele e ele apenas finalizou. Devemos pedir para saber quanto tem sido gasto nessas viagens, e não devemos aceitar o falso argumento de que é segredo de Estado por se tratar da segurança presidencial.

Queremos saber esses valores, diárias de agentes, combustível, veículos, alimentação, tempo, enfim, o custo operacional desses passeios desnecessários, que vão contra a política de distanciamento, pois causam aglomeração, e que a rigor, não é preciso a presença do governante seja nas inaugurações, seja nas formaturas, já que os custos desses deslocamentos são muitas vezes superiores ao que está querendo entregar ao povo. É mais propaganda enganosa do governante do que uma necessidade, principalmente numa época em que o Estado e o governo têm que economizar, e que acaba economizando na educação para torrar na locomoção presidencial desnecessária e esbanjadora.

É uma situação em que as relações privadas se sobrepõem às relações públicas, em conflito com o interesse comum. A apropriação de vantagens e privilégios seria, assim, a outra face da atividade de indivíduos e associações de indivíduos que legislam, controlam a justiça e administram os negócios públicos em benefício próprio – anulando, desta forma, o governo como expressão da autonomia e da autoridade dos cidadãos. É uma corrupção da república e da vida republicana.

Roberto de Barros Freire é professor do Departamento de Filosofia/UFMT

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